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em 21/09/2015

Mal na tela: cinema pernambucano ainda vira as costas para pessoas com deficiência

Plateia lotada em um cinema. Foto: Jéssica Pimentel/Divulgação Plateia lotada em um cinema. Foto: Jéssica Pimentel/Divulgação

Segunda reportagem da série analisa a falta de versões e espaços acessíveis na indústria do cinema para pessoas com deficiência

A sensível história do adolescente Leonardo rendeu ao filme Hoje eu quero voltar sozinho uma das melhores bilheterias de filmes independentes no ano passado, com 200 mil espectadores. Mas, apesar da deficiência visual do personagem principal, o longa-metragem de Daniel Ribeiro entrou em cartaz em formato acessível em apenas uma sala, em São Paulo. Com auxílio do aplicativo gratuito WhatsCine, da ONG Mais Diferença, ofereceu audiodescrição (serviço de narração do ambiente, expressões e outros detalhes visuais), Libras (linguagem brasileira de sinais) e Braille (linguagem tátil, para cegos).

Tropa de elite, Cidade de Deus, Carandiru e O pagador de promessas estão entre os filmes nacionais preferidos do professor Antônio Carlos Cardoso, da UFPE, mas, por ser surdo, ele não teve oportunidade de ver no cinema. A dificuldade é regra nas salas de exibição de todo o país. Poucas obras têm versões acessíveis e a maioria dos espaços não dispõe de equipamentos, como headphones, para a exibição. 

Em Pernambuco, ficam restritas a festivais e sessões especiais. "Acreditamos na acessibilidade a todas as pessoas. No Festival de Brasília, o filme ganhou um prêmio concedido por pessoas cegas e ficamos muito animados", explica Marcelo Gomes, diretor de Era uma vez eu, Verônica, um dos poucos pernambucanos com recursos para pessoas com deficiência, como Tatuagem, de Hilton Lacerda, e Ventos de agosto, de Gabriel Mascaro. O som ao redor, de Kleber Mendonça Filho, produção de maior projeção do estado no exterior, não tem versão acessível.

O longa pioneiro Era uma vez eu, Verônica foi exibido apenas em sessões especiais para cegos e disponível em DVD, pois nenhuma sala do estado conta com os equipamentos necessários. "Eles devem fazer parte do patrimônio de cada sala. É questão de criação de um novo comportamento dos produtores e das salas, mas o processo é lento", acredita João Júnior. A audiodescrição de um filme de 100 minutos custa cerca de R$ 10 mil, de acordo com o produtor. 

O administrador aposentado e fundador da empresa ProAcessi Manuel Aguiar estava no seleto grupo. "Eu já vi muitos filmes no Cine São Luiz com audiodescritor de ouvir, ou seja, alguém cochichando, ou sozinho, quando é algum filme de grande interesse para mim. Com a audiodescrição, imagina a sensação de cidadania, participar integralmente, ser respeitado no meu direito de usuário", conta ele, aos 67 anos. Em 2010, ele viu pela primeira vez um espetáculo com a ferramenta, do grupo carioca Os Inclusos e os Sisos, e foi responsável por intermediar a turnê deles pelo Nordeste.

Principal ícone da luta pela acessibilidade para surdos em filmes em Pernambuco, Marcelo Pedrosa lamenta não acompanhar a premiada produção do estado. Surdo, ele criou a campanha Legenda para quem não ouve, mas se emociona, há 10 anos, durante o festival Cine PE. "Eu me sentia excluído. Queria acompanhar a produção premiada do estado e não podia. Os eventos são muito segregacionistas", recorda o arquiteto.

Apesar do engajamento, ele vai ao cinema só para acompanhar produções internacionais e sofre com a popularização da dublagem. Em 2015, apenas 28% dos espectadores assistiram a cópias legendadas - as dubladas foram 59% e as nacionais, 13%, de acordo com a Filme B, especializada no mercado audiovisual. 

Marcelo pede legendas em português nos filmes nacionais. O mais recente Edital do Audiovisual do Funcultura obriga a produção de uma cópia com legendagem descritiva, Libras e audiodescrição de longas-metragens e produtos para televisão apoiados pelo fomento estadual, por exigência da Agência Nacional do Cinema (Ancine). Resta torcer para a chegada deles às salas de exibição.
fonte: Luiza Maia - Diario de Pernambuco

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