Encostada em um canto do Cine Brasília, uma estátua gigante do troféu Candango passa o tempo “olhando” para uma parede de tijolos vermelhos. Os dias de tédio do personagem mais famoso do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro terminaram ontem, quando a peça saiu do ostracismo e foi recolocada com pompa na entrada do Cine Brasília para recepcionar a entrada dos convidados que participarão da cerimônia de abertura da 47ª edição do festival.
Depois de dois anos praticando uma mostra competitiva volumosa com divisão entre documentários e ficções (curtas e longas), o Festival de Brasília retorna ao seu formato original, com uma mostra competitiva enxuta e forjada na aposta do conteúdo de películas realizadas por cineastas reconhecidos pela ousadia. “A linha tênue entre documentário e ficção não tem pertinência como gênero cinematográfico, portanto, muitos filmes são colocados na condição de híbridos, o que corrobora com esta reunião numa única competitiva dividida apenas em longas e curtas-metragens”, explica Sara Rocha, coordenadora adjunta do festival. “Não fizemos distinção entre gêneros cinematográficos. Acreditamos que não cabe aos festivais segmentar. Os filmes foram escolhidos pela qualidade artística e de linguagem”, explica Sara.
A seleção deste ano, com seis longas e 12 curtas, enfatiza o trabalho de coletivos de cinema do Brasil com o exemplo capitaneado pelo ceilandense Branco sai. Preto fica, dirigido por Adirley Queirós e produzido pela CeiCine — o filme de Adirley também é concorrente da Mostra Brasília— e pelo coletivo Filmes de Plástico, localizado na cidade mineira de Contagem com Ela volta na quinta, dirigido por André Novais.
Competição acirrada
O cinema pernambucano está representando por dois longas: Brasil S/A, de Marcelo Pedroso, e Ventos de agosto, de Gabriel Mascaro. O filme de Mascaro recebeu menção honrosa do último Festival de Cinema de Locarno na Suíça. A Paraíba terá um representante com Pingo d’água, de Taciano Valério. Ainda na competitiva de longas, consta o documentário paulistano Sem pena, de Eugenio Puppo. As fitas de longa duração concorrem a um total em prêmios no valor de R$ 420 mil.
O estado campeão de indicações na competitiva de curtas é São Paulo, com cinco representantes (Estátua! Geru, La llamada, Bashar e B-flat). Sem coração, dirigido em parceria com Nara Normande e Tião (simplesmente), foi considerado o melhor curta-metragem na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, na França, e compete com o conterrâneo de Pernambuco Loja de reptéis, de Pedro Severien. O curta de Brasília, Crônicas de uma cidade inventada, dirigido por Luísa Caetano, estará concorrendo na competitiva principal e Mostra Brasília. Completam a seleção de produções que concorrerão a um total de R$ 130 mil o maranhense Nua por dentro do couro (direção de Lucas Sá) e o mineiro Vento virado, de Leonardo Cata Preta.
Capilarização
Apesar de todos os flashes voltados para o Cine Brasília, a melhor notícia do ano foi a expansão do festival para outras cidades além do Plano Piloto. A mera exibição de filmes desprovida de debates foi corrigida nos espaços do Gama, de Sobradinho, de Ceilândia e de Taguatinga e agora os espectadores dessas cidades terão acesso não só aos filmes, mas também ao que seus realizadores dirão depois da exibição por meio de encontros, palestras e cursos.
“Procuramos integrar as populações de todas as cidades onde haverá o festival, inclusive com votação do júri popular. O critério técnico está sendo rigorosamente cuidado para que as exibições tenham o mesmo padrão do Plano Piloto”, comenta Sara.
Há alguns anos, um dos motivos para queixas de cineastas do DF era que as projeções da Mostra Brasília realizavam-se timidamente em espaços culturais menos nobres da cidade. Organizadas pela Câmara Legislativa, as exibições de produções da região ocuparão o Cine Brasília, no Plano Piloto, e tiveram as sessões igualmente distribuídas entre as outras cidades. “Muitas vezes, os filmes foram rodados nessas próprias cidades, e os participantes não tinham a chance de se ver na tela. Com a distribuição da Mostra Brasília, o público poderá ser ver representado no cinema”, acredita a coordenadora adjunta.
Uma antiga promessa feita pela Secretaria de Cultura parece que finalmente será realizada. O Cine Brasília deve inaugurar o projetor digital permanente da casa. O aparelho permite projeções feitas em todos os formatos digitais e terá como estreia nada menos que a exibição do clássico do cinema novo, Deus e o diabo na terra do sol (Glauber Rocha), em cerimônia restrita a convidados.
fonte: http://www.festbrasilia.com.br/