Uma forma de inserir culturalmente pessoas com problemas visuais “Criou-se uma falácia de que pessoas cegas não vão ao cinema, não gostam de teatro. É um mito. O que faltam são políticas de acessibilidade”. É o que diz a paraibana Joana Belarmino, deficiente visual, pesquisadora, jornalista e blogueira. Diferentemente do que está enraizado no senso comum, pessoas cegas consomem e procuram por cultura – inclusive a audiovisual. O acesso a produtos desse tipo está diretamente relacionado a iniciativas de acessibilidade. Um das formas de propiciar ao deficiente visual o prazer de assistir a um filme, por exemplo, é o trabalho de audiodescrição. Segundo o Tramad (Tradução, Mídia e Audiodescrição), grupo de pesquisa da UFBA que se dedica ao estudo da acessibilidade audiovisual, “a audiodescrição é um recurso de tecnologia assistiva que permite a inclusão de pessoas com deficiência visual junto ao público de produtos audiovisuais”. De acordo com Iracema Vilaronga, pesquisadora e integrante do Tramad, a audiodescrição se mostra como fundamental para a inclusão de pessoas com dificuldade na visão. “Sem este recurso, essas pessoas ficam privadas de usufruir totalmente de produções audiovisuais, como cinema, teatro, museus, circo, e até mesmo ficam em desvantagem no momento de exercer seu papel de consumidoras, uma vez que a publicidade também não ‘enxerga’ a pessoa visualmente limitada como consumidora em potencial”, complementa. Como explica Vilaronga, a audiodrescrição é realizada em quatro etapas. Na primeira, faz-se um roteiro, com o qual há a preocupação de traduzir em forma de áudio todo trecho que necessite de descrição para um maior entendimento por parte do deficiente visual. Tudo – destaca a pesquisadora –, preocupando-se em respeitar a estética do produto audiovisual, mantendo a sonoplastia original. Em seguida, marca-se tempo em que há intervalos mudos, adaptando as descrições do roteiro ao tempo disponível. Em uma terceira etapa, faz-se um teste de roteiro, ensaiando as locuções, para, na etapa seguinte, fazer as gravações. Nelas, há a preocupação inclusive de adequar a entonação da voz de acordo com o gênero, estilo e ritmo da produção audiovisual. Como alternativa, pode-se audiodescrever um filme durante sua exibição, ao vivo, pulando a etapa de gravação. Para Joana Berlamino, a audiodescrição configura-se como “fundamental para que as pessoas cegas, as pessoas disléxicas, e as pessoas com deficiência auditiva, através do close caption, possam usufruir plenamente da produção audiovisual”. Este mercado de produtos culturais com opção de audiodescrição, segundo a blogueira, já está em formação, tendo iniciativas no cinema e no teatro. Para ela, a universidade costuma ser o local de onde surgem tais iniciativas, como é o caso do do trabalho do grupo Tramad. Audiodescrição na TV – A preocupação com a acessibilidade do audiovisual a deficientes visuais de fato vem crescendo. Desde de 1º de julho deste ano as emissoras brasileiras passaram a ser obrigadas a transmitir duas horas de sua programação com recurso de audiodescrição, permitindo aos telespectadores cegos um contato com os produtos elaborados pela televisão nacional aberta. No entanto – e especialmente em Salvador –, a maior dificuldade para levar projetos de acessibilidade adiante, segundo Iracema Vilaronga, é a “falta de interesse e vontade política tanto de órgãos públicos quanto de empresas privadas no financiamento e estímulo à educação e à cultura”. Segundo a pesquisadora, há ainda a questão da falta de informação, tanto dos administradores públicos quanto das pessoas com deficiência. Haveria um processo de exclusão, fazendo com que os deficientes visuais estejam à margem da produção de cultura na cidade. “Cabe um trabalho educativo de formação de público, além de conscientização da sociedade de um modo geral acerca dos direitos e deveres legalmente constituídos, além dos princípios dos direitos humanos e de respeito à diversidade”, completa.